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RecRutamento no exéRcito PoRtuguês – do condado Portucalense ao século xxi

            ou a resposta a uma eventual ameaça militar de envergadura como no caso da
            Inglaterra  isabelina,  resumem  uma  mesma  intenção,  o  desejo  de  centralizar
            o  recrutamento  na  figura  maior  do  reino:  o  rei.  A  força  militar  transfere-se
            progressivamente  para  as  mãos  do  monarca,  dando-lhe  o  poder  de  mover
            a  guerra,  ultrapassando  assim  alguns  dos  constrangimentos  do  passado,
            nomeadamente a dependência das hostes senhoriais. É dado adquirido que o
            caso primeiro deste processo – porque o mais conseguido – consiste na Espanha.
            A conquista final de Granada foi alcançada à custa de sucessivas expedições,
            só  possíveis  mediante  uma  reforma  militar  que  possibilitou  mobilizar  todo
            o potencial bélico dos reis Católicos. O acautelar da defesa, ou a vontade de
            marchar para a guerra alimentaram reformas similares na Inglaterra henriquina
            e isabelina, ou em entidades políticas de menor envergadura territorial e política
            como foi o caso do ducado de Sabóia.
                  Em Portugal, o processo de atualização militar em moldes europeus começou
            no início do século XVI. A expansão manuelina, cujos pontos altos consistem na
            reconquista de Goa (1512)  e tomada de Azamor (1513) , apoiou-se na criação de
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            companhias moldadas sobre o sistema desenvolvido pelo vizinho ibérico. Findo
            o surto expansionista africano, e depois do desaparecimento do impulsionador
            deste sistema no Oriente – Afonso de Albuquerque –, a reforma esmoreceu. Ao
            mesmo tempo, a ausência de uma ameaça militar por parte dos vizinhos, potenciou
            resistências à implementação deste tipo de reformas… resistências que se sentiam
            em  Espanha,  nomeadamente  a  fuga  à  incorporação  forçada.  O  resultado,  na
            melhor das hipóteses, era a existência de um excesso de soldados “bisonhos” –
            isto é, homens sem experiência militar – e, ou a falta de recrutas. Em todo o caso,
            foi sempre patente a consequente dependência de mercenários.

                  Depois  de  algumas  tentativas  falhadas  de  relançamento  de  uma
            reorganização militar de vulto por D. João III , esta foi finalmente implementada
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            ao longo do reinado de D. Sebastião. Os objetivos do monarca encontram-se
            equacionados no preâmbulo do “Regimento dos capitães-mores e mais capitães
            e oficiais das companhias de gente de cavalo e de pé e da ordem que terão em
            se exercitarem”, o diploma estruturante desta reforma: “para se com elas se


            4  RODRIGUES, Vítor Gaspar – As companhias de Ordenanças no Estado Português da Índia, 1510-
            -1580. In revista Oceanos, nº19-20. Lisboa: CNPCDP, pp. 212-19.
            5  SOUSA, Luís Costa e – Arte na Guerra. Lisboa: Tribuna, 2006, pp. 28-35.
            6  COSTA, Fernando Dores – Milícia e sociedade. In Nova História militar de Portugal, v.2. Lisboa:
            Círculo de Leitores, pp.74-76.
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