Page 45 - JE719
P. 45

Cultura & Lazer                         .45

                                                                                      UMA VISÃO DA HISTÓRIA







            hipotética união com Castela. E não falta, neste plano,   Geração” (os filhos que nascerão do casamento com
            a intervenção do sobrenatural, na elaboração da lenda   D. Filipa de Lencastre ), ou seja, da era gloriosa dos
                                                                                         3
            que a historiografia posterior consagrou, segundo a     Descobrimentos, essa nova ordem política e dinástica
            qual o próprio S. Marcos teria aparecido no campo de    só existirá mercê da afirmação militar no campo de ba-
            batalha, encorajando os portugueses e antevendo a sua   talha. Por outras palavras, a vitória portuguesa na Bata-
            vitória. Como testemunho, teria ficado inscrita na ro-  lha de Trancoso permitiu a afirmação da independência
            cha a marca da ferradura do cavalo a cujo cavaleiro sur-  de Portugal face a Castela, surgindo na antecâmara da
            gira a aparição… No local da Batalha, existia a Capela   Batalha de Aljubarrota e, na realidade, preparando o
            de S. Marcos, cujas ruínas ainda hoje podemos admirar,   terreno para que fosse possível a mais celebrada vitória
            e que foi incendiada pelas hostes de Castela, quando se   militar portuguesa.
            dirigiam para Aljubarrota.                                 A Batalha de Trancoso surge num contexto polí-
               No plano político, é sabido que o reinado de D. Fer-  tico-militar marcado por uma nova vaga de invasões
            nando fora marcado por lutas com Castela (as chama-     castelhanas a Portugal. O rei D. Juan I planeara um
            das guerras fernandinas), tendo Portugal sofrido várias   ataque em três frentes: um bloqueio naval a Lisboa;
            derrotas e achando-se numa situação de instabilidade.   um novo cerco a Elvas, entrando por Badajoz; e uma
            A paz fora consolidada pelo Tratado de Salvaterra de    invasão pela Beira Alta, progredindo através de Almei-
            Magos, em 1383, em cujas cláusulas constava o casa-
            mento da única filha de D. Fernando e D. Leonor Teles,
            Beatriz, com o herdeiro do trono de Castela, sucessor
            de D. Juan I. Sucede que, pela morte precoce de sua
            mulher, o próprio monarca vem a desposar a princesa
            portuguesa, o que na prática significava a união futura
            das duas coroas. D. Fernando morre também nesse ano,
            aos 38 anos, e a viúva Leonor Teles assume a regência
            do reino, prefigurando-se desde logo uma união com
                   1
            Castela . A contestar este cenário político está D. João,
            Mestre de Avis, que a 6 de dezembro é aclamado “Rege-
            dor e Defensor do Reino”, em Lisboa, episódio ins-
            crito na imortal crónica de Fernão Lopes. Entretanto,
            D. Juan I de Castela respondera, invadindo novamente
            Portugal, em 1384, e cercando Lisboa (já o fizera dois
            anos antes). Sucedem-se as lutas pela independência.
               A Batalha de Trancoso ocorre entre dois marcos
            importantes, do ponto de vista militar -   a Batalha
            de Atoleiros (6 de abril de 1384) e a Batalha de Alju-
            barrota (14 de agosto de 1385), inserindo-se ainda no
            mesmo contexto a Batalha de Valverde (14 de outubro
            de 1385). Nestas se distinguiu D. Nuno Álvares Pereira,
            que como sabemos teve uma ação preponderante, nos
            planos estratégico e operacional, para o sucesso portu-
            guês na Batalha de Aljubarrota e para a consagração de
                                                          2
            D. João, Mestre de Avis, como futuro rei D. João I .
               Na verdade, Aljubarrota constitui um epílogo, e se
            nessa tarde gloriosa de 14 de agosto de 1385 se inicia
            um novo capítulo da História de Portugal, que permiti-
            rá a subida ao trono de D. João I e o advento da “Ínclita   Monumento à Batalha de Trancoso  (Fonte: www.mapsus.net/pt)



                                                                                                              JE  719– MAI22
   40   41   42   43   44   45   46   47   48   49   50