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4. Recrutamento Militar no Século XVI Português: A Inconsistência de um Sistema (1495-1578)

                     O aumento exponencial dos exércitos em número de homens e em meios
               logísticos marcou o início do século XVI e o aperfeiçoamento da artilharia, terrestre
               e naval, bem como a nova arquitectura militar foram o vector tecnológico que
               induziu as mais diversas transformações. A grande batalha de Ravena, a 11 de
               Abril de 1512, timbrou o início de uma nova era na história da guerra europeia.
               O duelo de artilharia com que se iniciou, provocando um inédito número de
               baixas, condicionou todo o movimento da cavalaria e da infantaria, cuja função
               no terreno rapidamente teve de ser adaptada e repensada. A movimentação das
               forças de infantaria e o seu comando, sempre mais lento e moroso tendo em
               conta as grandes formações, quadrados maciços com frentes de 25 a 100 homens,
               tornou-se um complexo exercício que estimulou sobremaneira a produção teórica
               e  doutrinária,  crescentemente  imparável  ao  longo  do  século.   Comandantes
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               houve que, cedo, compreenderam que a solução suíça para a organização da
               infantaria  comportava  diversos  problemas:  unidades  demasiado  numerosas,
               difíceis de manobrar e, porque armadas sobretudo de piques, tinham uma função
               demasiado específica no campo de batalha. Serão os alemães os primeiros a imitar
               as formações suíças, mas com uma variante: a introdução de pequenas unidades
               de infantaria munidas de arma de fogo, os Landsknecht,  que proporcionará uma
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               utilização mais criativa das forças. Todavia, serão os espanhóis quem mais esforço
               dedicará à constituição de forças mistas de infantaria, unidades compostas por
               piques, arcabuzes e rodelas (soldados armados de espada e escudo). Gonzalo
               de Córdova soube utilizar estas unidades mistas e mais ligeiras, combinando-as
               com a artilharia e a cavalaria e obrigando a cavalaria a abandonar a sua clássica
               utilização como arma de choque, utilizada para romper formações e desbaratar
               a infantaria. O Grande Capitão prefere uma cavalaria que se dedique sobretudo à
               disrupção de linhas, à perseguição e ataques pontuais e de flanco.


               7   Só na Biblioteca Nacional de Madrid e para o século XVI, existem 19 tratados de fortificação,
               assédio e defesa de praças fortificadas, publicados em Espanha e em língua castelhana. Em língua
               alemã e italiana também há bastantes, sendo Il Vallo, de Giovanni Battista Della Valle, publicado
               em Veneza em 1524 (a editio princeps parece ser de Nápoles, 1521), uma obra de referência,
               quase um livro de bolso contendo ensinamentos variados, que grande difusão teve na Europa.
               Cf. PERAL, Esther Merino – El arte militar en la época moderna: los tratados «de re militari» en el
               Renacimiento. 1536-1671. Aspectos de un arte español. Madrid: Ministerio de Defensa, Centro de
               Publicaciones, 2002, passim.
               8   O primeiro regimento de Landsknecht, formado a mando de Maximiliano I, data de 1487. O
               seu comando foi entregue a Georg von Frundsberg, o general que instituiu e tornou famosa esta
               força. Inicialmente treinados por suíços, os landsknecht cedo se afastaram dos seus mentores por
               se inclinarem mais para o uso de armas de fogo.

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