Page 212 - recrutamento
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RecRutamento no exéRcito PoRtuguês – do condado Portucalense ao século xxi
não preparado militarmente. Os primeiros tempos não correram bem, com os
tercios hispânicos a penetrarem em solo francês.
Deveu-se à ação e capacidade organizativa dos intendentes Michel
Le Tellier, durante o magistério de Mazarino, e ao seu filho, marquês de
Louvois, no reinado de Luís XIV a constituição de um exército nacional.
Aos capitães competiu a responsabilidade de recrutamento interno, cujas
arbitrariedades ficaram sujeitas a permanente fiscalização da burocracia do
estado. As insuficiências foram colmatadas por recurso a mercenários no
exterior, que constituiriam cerca de um quinto do total de efetivos, mas sem
recurso aos condottieri, por razões políticas. Foram construídos os primeiros
aquartelamentos e adotados uniformes reais, iguais em cada regimento, com
estes a deixarem de formar na linha de batalha segundo a hierarquia dos seus
comandantes. Foram também criados os serviços de intendência e sanidade,
através da instalação de armazéns ao longo das linhas de comunicação,
permitindo uma regularidade e continuidade nas operações inédita . E, desta
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forma, em meados do decénio de trinta do século XVII, a França aprontou um
exército de 150 mil homens .
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Nesse período, emergiram os generais franceses Condé e Turenne como
artífices das inovações militares. Se o duque d’Enghien, príncipe de Condé (1621-
-1686), foi o comandante tático que, ao derrotar o exército hispânico comandado
pelo português Francisco de Melo, em Rocroi, em 1643, virou o curso da guerra,
o marechal Turenne (1611-1671) notabilizou-se como estratega nas campanhas
da Alemanha (1644-1648) contra os habsburgos, obtendo um conjunto de
vitórias que deram ampla liberdade negocial a Mazarino na Conferência de
Paz de Vestefália, em 1648 . Absorvendo alguns dos ensinamentos militares
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das Províncias Unidas e da Suécia, o Exército Francês alterou a organização
hispânica-tipo, adotando o princípio da manobra, mediante uma conjugação de
fogo, movimento e flexibilidade.
Assim, na infantaria individualizaram-se os mosqueteiros, os piqueiros
e os fuzileiros, a cavalaria passou a armar-se preferencialmente de sabre, e a
artilharia, antes prerrogativa de elementos civis, passou a contar com militares
profissionais, que exerciam a sua função com carácter permanente. A unidade
30 SELVAGEM, Carlos – Portugal Militar. Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 1991, p. 434.
KENNEDY, 1985, p. 84.
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BÉRENGER, Jean – Turenne. Librairie Arthème Fayard, 2007, pp. 191-266.
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200