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RecRutamento no exéRcito PoRtuguês – do condado Portucalense ao século xxi

            de recrutamento e de remuneração dos combatentes. E se alguns não tiveram o

            resultado desejado, outros acabaram por se revelar bem-sucedidos,  mantendo-
            -se em vigor durante largas décadas, por vezes até aos alvores da Modernidade.


                  o Recrutamento da Nobreza

                  A primeira grande operação militar do reinado de Afonso III, a conquista
            de Faro, em 1249, foi planeada com o intuito, por um lado, de submeter o último
            grande bastião muçulmano no Algarve e, por outro, de congregar, em torno de
            um objectivo comum, a nobreza do reino, profundamente fragilizada e dividida
            pela guerra civil de 1245-1248. E se o primeiro objetivo foi plenamente alcançado,
            o segundo acabou por se mostrar impossível de atingir, desde logo pela ausência
            massiva dos membros da alta-nobreza, em particular dos ricos-homens detentores
            de tenências que, pura e simplesmente, não se integraram na hoste régia. E ainda
            que a historiografia, desde Alexandre Herculano, tenha procurado os mais diversos
            motivos para explicar essa ausência, actualmente sabemos que tudo não passou
            de uma forma de demonstrar ao rei o seu desagrado pela forma como estavam
            a  ser  remunerados.  Era  o  resultado  da  falência  do  modelo  de  recrutamento
            feudo-vassálico, o qual assentava na prestação de um serviço militar por parte do
            feudatário, em contrapartida pela entrega de um senhorio, de uma honra, de um
            préstamo territorial ou de uma tenência. O problema estava longe de ser novo e
            tinha já levado, por exemplo, ao fim abrupto do cerco a Elvas em 1226, quando
            Sancho II foi literalmente abandonado pela maior parte das mesnadas nobres que
            haviam sido mobilizadas para essa campanha. E depois de 1249 voltaria a surgir,
            durante os confrontos com Leão-Castela, em 1250 e em 1252-1253 .
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                  Terá  sido  na  sequência  destes  últimos  conflitos  que  Afonso  III  decidiu
            resolver os problemas decorrentes da relutância da nobreza em cumprir as suas
            obrigações de natureza feudo-vassálica. E porque a questão se manifestava de
            forma mais expressiva entre os ricos-homens detentores das tenências das terras,
            o  rei  procurou  resolvê-lo  primeiro  através  da  escolha  de  novos  comandantes
            para essas circunscrições, mudando-os de terra sem qualquer preocupação com
            a  hereditariedade  nem  com  o  carácter  vitalício  de  muitas  dessas  tenências .
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              MARTINS, Miguel Gomes – A Arte da Guerra em Portugal (1245-1367). Coimbra: Imprensa da
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            Universidade de Coimbra, 2014, pp. 32-35.
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              VENTURA,  Leontina  –  A Nobreza de  Corte de
            Univer    Coimbr  (Dissertaç    Doutoramento,  policopiada),  V    1992,      e  286-
            -287.
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