Page 62 - recrutamento
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RecRutamento no exéRcito PoRtuguês – do condado Portucalense ao século xxi
de recrutamento e de remuneração dos combatentes. E se alguns não tiveram o
resultado desejado, outros acabaram por se revelar bem-sucedidos, mantendo-
-se em vigor durante largas décadas, por vezes até aos alvores da Modernidade.
o Recrutamento da Nobreza
A primeira grande operação militar do reinado de Afonso III, a conquista
de Faro, em 1249, foi planeada com o intuito, por um lado, de submeter o último
grande bastião muçulmano no Algarve e, por outro, de congregar, em torno de
um objectivo comum, a nobreza do reino, profundamente fragilizada e dividida
pela guerra civil de 1245-1248. E se o primeiro objetivo foi plenamente alcançado,
o segundo acabou por se mostrar impossível de atingir, desde logo pela ausência
massiva dos membros da alta-nobreza, em particular dos ricos-homens detentores
de tenências que, pura e simplesmente, não se integraram na hoste régia. E ainda
que a historiografia, desde Alexandre Herculano, tenha procurado os mais diversos
motivos para explicar essa ausência, actualmente sabemos que tudo não passou
de uma forma de demonstrar ao rei o seu desagrado pela forma como estavam
a ser remunerados. Era o resultado da falência do modelo de recrutamento
feudo-vassálico, o qual assentava na prestação de um serviço militar por parte do
feudatário, em contrapartida pela entrega de um senhorio, de uma honra, de um
préstamo territorial ou de uma tenência. O problema estava longe de ser novo e
tinha já levado, por exemplo, ao fim abrupto do cerco a Elvas em 1226, quando
Sancho II foi literalmente abandonado pela maior parte das mesnadas nobres que
haviam sido mobilizadas para essa campanha. E depois de 1249 voltaria a surgir,
durante os confrontos com Leão-Castela, em 1250 e em 1252-1253 .
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Terá sido na sequência destes últimos conflitos que Afonso III decidiu
resolver os problemas decorrentes da relutância da nobreza em cumprir as suas
obrigações de natureza feudo-vassálica. E porque a questão se manifestava de
forma mais expressiva entre os ricos-homens detentores das tenências das terras,
o rei procurou resolvê-lo primeiro através da escolha de novos comandantes
para essas circunscrições, mudando-os de terra sem qualquer preocupação com
a hereditariedade nem com o carácter vitalício de muitas dessas tenências .
4
MARTINS, Miguel Gomes – A Arte da Guerra em Portugal (1245-1367). Coimbra: Imprensa da
3
Universidade de Coimbra, 2014, pp. 32-35.
4 Afonso III Coimbr Faculdade Letr da
VENTURA, Leontina – A Nobreza de Corte de
Univer Coimbr (Dissertaç Doutoramento, policopiada), V 1992, e 286-
-287.
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