Page 68 - recrutamento
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RecRutamento no exéRcito PoRtuguês – do condado Portucalense ao século xxi
delle tinham. E este [rei] ouve muytos mais vassallos que os outros reys que
ante elle forom” .
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E ainda que as fontes nos revelem muitos casos de indivíduos adolescentes
ou já adultos que ingressaram na vassalidade régia e passado, por isso, a receber
contia, por norma, a outorga destes estipêndios era feita aos vassalos quando
estes eram ainda crianças de tenra idade. Diz-nos Fernão Lopes que assim que
nascia um filho legítimo a um fidalgo, o escrivão das contias enviava logo a sua
casa a “carta da comtia que avia daver” correspondente a um valor equivalente
à do seu pai e que era colocada, por aquele oficial ou um seu representante, no
peito da criança, “no berço omde jazia, ou no colo da ama se açertava emtaõ
de o ter” . Muito provavelmente era através desta carta que se estabelecia o
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vínculo vassálico – que parece, por isso, ter tido um certo carácter compulsivo
– entre quem a concedia e quem a recebia. Embora o cronista não revele qual o
momento em que a contia começava a ser paga, é possível que tal acontecesse
apenas a partir da idade de robora, isto é, quando o vassalo atingisse os 14 anos,
altura a partir da qual já se poderia esperar dele, pelo menos em teoria, um
serviço militar efectivo. As remunerações, que até essa idade teriam um valor
meramente simbólico, eram então aumentadas para um valor consentâneo com o
serviço militar pretendido , ou seja, proporcionalmente ao número de cavaleiros
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com que o vassalo passaria a apresentar-se sempre que o rei o convocasse .
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Este modelo de recrutamento – rapidamente adoptado também por alguns
grandes senhores nobres e pelos infantes – permitia a resolução de diversos
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problemas: obrigava o vassalo à prestação de um serviço militar; permitia o
estabelecimento de contingentes militares numericamente estáveis, já que
cada vassalo que morria era substituído na contia por um outro, em princípio,
o seu filho primogénito , teoricamente bem armados e convenientemente
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22 Crónica Geral de Espanha de 1344, Vol. 4, Cap. DCCXIX, p. 243.
Crónica de D. João I. Fernão Lopes. Porto: Civilização, 1990-1991. Vol. 2. Cap. LXX, p. 178;
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Crónica de D. Pedro I. Fernão Lopes. Ed. Crítica. Tradução e glossário por Giuliano Macchi. Roma:
Edizioni dell´Ateneo, 1966, Cap. I, p. 92.
24 GOMES, 1995, p. 192.
25 Crónica de D. João I, Vol. 2, p. 178.
26 MARTINS, 2014, pp. 44-45.
27 MARTINS, 2014, pp. 50-51.
28 Crónica de D. João I, Vol. 2, Cap. LXX, pp. 178-179; e Chancelarias Portuguesas: D. Afonso IV.
Ed. preparada por A. H. de Oliveira Marques. Vol 2. Lisboa: I.N.I.C., 1990-1992, doc. 115, p. 211,
de 1338, Agosto, 3.
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