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RecRutamento no exéRcito PoRtuguês – do condado Portucalense ao século xxi
De facto, os aquantiados eram um grupo bastante heterogéneo.
Os mais ricos deveriam possuir uma montada de qualidade e armamento
(defensivo e ofensivo) completo – seria o caso de Rodrigo Eanes, morador em
Torres Vedras, que serviu o rei na Batalha de Alfarrobeira com “boo cauallo
e armas” , conforme atesta uma carta de perdão dada em 1452; outros, de
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menores rendimentos, apresentavam-se apeados com alguma arma branca
ou de haste, por vezes adquiridas ou mantidas com sacrifício – por exemplo,
sabemos que D. Afonso V confirmou, em 1456, uma carta de seu avô, de 1427,
confirmação de carta os lavradores do termo de Guimarães se encontravam
de tal forma castigados de sisas e serventias para as muralhas que, se fossem
castigados com mais tributação, “venderom os bois com que lavram e os bees
per que se maanteem pera comprar as ditas lanças e escudos.” 87
Neste âmbito, é complexo conhecer os valores das quantias que exigiam
a integração da população concelhia em cada uma das categorias militares. Isto
não só porque o período corresponde a uma época de grandes flutuações e
desvalorização da moeda como por os valores variarem de reinado para reinado
e, mais ainda, de comarca para comarca de Portugal. Por exemplo, à luz do
regulamento de 1418, na Estremadura quem tivesse um mínimo de 40 marcos de
prata de fortuna pessoal ficava obrigado a possuir cavalo, bacinete, cota de malha,
loudel, pratas e avambraços; ao mesmo tempo, no Algarve, as mesmas quantias
passavam para metade. Ou seja, com pouca fortuna pessoal ficava-se sujeito a ter
de possuir boas armas e um cavalo, algo sempre tão penoso de manter .
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Independentemente das flutuações que os categorizavam, os aquantiados
ficavam, pois, obrigados a adquirir e conservar as armas (e, nalguns casos,
montadas), devendo apresentar-se nos teatros de operações quando convocados
para a guerra pelo respectivo coudel. Este serviço militar seria objecto de soldo
de campanha da Coroa quando passava as seis semanas, limite do sustento da
parte dos respectivos municípios. Em compensação, os aquantiados gozavam
de alguns privilégios, como a escusa de anúduvas e serventias do rei, ou dar
aposentadoria (salvo ao rei ou a seus filhos), isenção de pagamento de jugada
e oitavo (caso dos que mantinham cavalo), além, claro está, do direito de
aposentação por idade de 70 anos ou por algum motivo de força maior .
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86 Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Chancelaria de D. Afonso V, liv. 12, fl. 129 vº.
87 Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Chancelaria de D. Afonso V, liv. 13, fl. 113.
88 MONTEIRO, João Gouveia – Nova História Militar de Portugal. Vol. 1, p. 196.
89 IDEM – Ibidem, p 196.
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