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RecRutamento no exéRcito PoRtuguês – do condado Portucalense ao século xxi
Baquero Moreno, na Batalha de Alfarrobeira (1449), D. Afonso V contou na
sua hoste com 219 homiziados, mais de metade dos quais condenados com
crimes de homicídio. Anos mais tarde, na campanha de Toro, identificámos
a alusão a um desses perdões gerais dirigidos aos homens a conta da justiça,
num diploma régio de 26 de Novembro de 1476 em que se absolvia Diogo
Afonso, carniceiro e morador em Tavira, do crime de assassinato da própria
mulher, Catarina Martins, bem como da fuga do castelo daquela vila .
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Mas se o perfil agressivo destas gentes a contas com a justiça poderia
ter a sua utilidade na guerra, a verdade é que estes contingentes se tornavam
muitas vezes incómodos para as populações locais quando estacionados.
Não por acaso, nas Cortes de Lisboa de 1446, na sequência das intervenções
de apoio ao rei Juan II de Castela, os povos pediram ao infante D. Pedro que
desmobilizasse as tropas dos fronteiros, as quais se encontravam repletas de
homiziados, de contrabandistas e de outros homens perigosos .
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A expansão portuguesa no Norte de África parece ter recorrido
sobremaneira a estes contingentes. De facto, se as comitivas nobres
constituíram o “núcleo duro” das guarnições das praças lusas em Marrocos,
a “carne para canhão” era garantida por gente comum, onde se incluem estes
indivíduos que embarcavam para cumprirem os degredos. Este expediente foi
previsto, desde cedo, por D. João I, conhecendo-se imensos casos de homens
que recebem cartas de perdão, nas quais se comutam penas graves que tantas
vezes eram reduzidas para metade em troca do serviço militar .
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As penas conhecidas são as mais diversas e citaremos alguns casos. A
título de exemplo, sabemos que em 1451 D. Afonso V atribui carta de perdão
a Afonso Fernandes, morador em Lisboa, o qual fora acusado do assassinato
de João Anes Moreno, morador em Monfalim. Após servir na Batalha de
Alfarrobeira ao lado do monarca, em 1449, ao pedir perdão foi condenado a
servir seis anos em Ceuta, onde se deveria apresentar, no prazo de três meses,
ao respectivo capitão, que o mandaria inscrever no livro de homiziados (que
registava o nome destes homens a contas com a justiça nas praças norte-
-africanas) .
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115 ANTT – Chancelaria de D. Afonso V, Livro 7, f. 110.
116 MONTEIRO, João Gouveia, Nova História Militar de Portugal. Vol. 1, pp. 203-204.
117 MONTEIRO, João Gouveia, COSTA, António Martins – 1415: A conquista de Ceuta, pp. 154-155.
118 ANTT, Chancelaria de D. Afonso V, liv. 11, fl. 131 v.º.
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