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RecRutamento no exéRcito PoRtuguês – do condado Portucalense ao século xxi

            Soviéticas  (URSS)  e  dos  seus  aliados/satélites,  afiançou-se  da  inevitabilidade
            da  perda  de  grande  parte da  Europa  ocidental  e perspetivou-se  a  defesa  de
            redutos  insulares  ou  quase-insulares  como  a  Península  Ibérica  como  ponto
            de partida de um contra-ataque maciço, após a aviação anglo-americana ter
            amolecido massivamente as potencialidades bélicas do inimigo.  Santos Costa
                                                                      82
            tinha consciência desta leitura estratégica e fundamentava a sua interpretação
            dos  eventos  futuros  nesta  corrente  de  pensamento  estratégico  do  mundo
            anglo-saxónico,  o que para além do mais, ia ao encontro da visão da situação
                           83
            internacional e da política externa do ditador. 84

                  Esta  perspetiva  estratégica  de  Santos  Costa  acabaria  por  ser  por  ele
            teorizada,  já  nos  anos  50,  num  prefácio  para  a  obra  de  um  seu  discípulo,  o

            futuro general Andrade e Silva. Para Santos Costa, Portugal não podia observar-
            -se  como  um  Teatro  de  Operações  (TO)  exclusivo,  mas  devia  ser  inserido  na
            contextura  mais  alargada  da  Península  Ibérica.  Essa  realidade  advinha  de  a
            geografia peninsular, dos acidentes geográficos da Península Ibérica, mais do
            que entravarem, canalizarem a manobra das forças militares. Então, o verdadeiro
            baluarte da Península Ibérica, não estaria algures dentro dela, mas nos seus
            contornos, nos Pirenéus. Seria, não obstante, ainda passível de argumentação
            e legitimação um espaço nacional autónomo da geografia militar peninsular,
            da geoestratégia ibérica. Essa argumentação caía, no entanto, pela base face
            à emergência do poder aéreo transcontinental. Justificado a afirmação de um
            espaço geoestratégico peninsular, Santos Costa entra na legitimação do valor
            do bastião ibérico. Para ele, os soviéticos estavam em excelente posição para
            rapidamente se espraiarem pelo ocidente europeu. Considerando a fronteira do
            ocidente no rio Elba, Santos Costa afiança que só fracas linhas, o Reno/Alpes de
            Sabóia e o Loire/Ródano, sustentam as possibilidades de defesa antes da forte
            muralha pirenaica. Mas a defesa ter-se-ia de concentrar nos Pirenéus, porque



            82  Vejam-se por exemplo, referências a este prisma geoestratégico e estratégico em MARQUINA
            BARRIO, António – España en la Politica de Seguridad Ocidental, 1939-1986. Madrid: Ediciones
            Ejercito, 1986, pp. 299-309.
            83  Observe-se a CLNRF – Correspondência de Santos Costa para Oliveira Salazar (1934-1950). 1º
            Vol., (s/l). Presidência do Conselho de Ministros, 1988, Doc. 92, p. 269. Nela é feito referência a
            posição do Coronel Solborg, antigo adido militar dos EUA em Portugal, que criticava a ideia de
            defesa avançada do ocidente no Elba e no Reno e propugnava pelo baluarte ibérico.
            84  Salazar parecia compartilhar com Santos Costa da visão de que “de uma arrancada” estaria o
            Exército Vermelho nos Pirenéus. NOGUEIRA, Franco – As Crises e os Homens. 2ª Edição. Porto:
            Civilização Editora 2000, p. 315.
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