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11. Nação e Mobilização – Estratégia e Recrutamento na Era Salazar (1933-1959)

               Republicana e a Guarda Fiscal (art.º 6).  Dois pormenores são de ressalvar
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               no art.º 6: o facto de a subordinação do Exército ser ao Ministro da Guerra
               (e não ao Ministério), e o facto de essa subordinação já não ter contraponto
               na inversa, ou seja, na subordinação do Ministério da Guerra ao Exército. Era
               uma afirmação completa de subordinação da força militar ao poder político.
               Não deixa por outro lado de ser estranho, mas talvez facilmente explicável, a
               questão da subordinação do Exército ao Ministro da Guerra, não porque na
               altura fosse Salazar a ocupar o cargo, mas mais porque o ministro era uma
               emanação direta, uma “criatura”, como se diria no século XVII, um espelho da
               vontade do Presidente do Conselho, um homem por ele escolhido, enquanto
               o Ministério da Guerra, por muito administrado por civis que fosse, estava
               sempre demasiado dependente do aparelho militar e por conseguinte era de
               muito mais complicado controlo. Ao assumir a subordinação do Exército ao
               Ministro da Guerra, Salazar como que afirmava que era ao governo, e ao chefe
               do governo, enquanto instituição, que aquele estava subordinado, e não ao
               respetivo departamento governamental, enquanto realidade administrativa e
               burocrática, em boa parte dirigido por militares.
                     A  legião  portuguesa,  como  uma  milícia,  servia  de  compensação,
               permitindo o aumento do efetivo mais reduzido da cobertura porquanto, em
               tempo  de  guerra,  se  subordinava  às  leis  militares,  ficando  dependente  do
               Ministério da Guerra para o seu emprego (art.º 7).  Esta subordinação trazia
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               duas consequências úteis porque, por um lado, demonstrava ao Exército (e às
               Forças Armadas) que a principal e única força armada do país continuava a ser
               ele (ou elas) e, por outro lado, compensava em parte a diminuição das grandes
               unidades  disponíveis  em  tempo  de  paz,  garantindo  um  adicional  reforço  da
               cobertura, dependente da força militar terrestre em caso de guerra.

               67  Ordens do Exército, Nº9, 13 de outubro de 1937, Lei 1960 de 1 de setembro de 1937, Lisboa,
               pp. 685 e 687.
               68  Ordens ..., p. 687. Sobre a Legião Portuguesa nos anos 30 até ao fim da Segunda Guerra Mundial,
               veja-se o estudo de RODRIGUES, Luís Nuno – A Legião Portuguesa, A Milícia do Estado Novo,
               1936-1944. Lisboa: 1996. A milícia que surgiu no contexto conturbado do início da Guerra Civil de
               Espanha, nesse momento de “crispação fascizante” de regime, nas palavras de Fernando Rosas,
               foi sendo olhada de soslaio pelo Exército, carente de ser o único poder efetivamente armado do
               país. Salazar teve consciência dos limites da Legião Portuguesa no contexto específico do Estado
               Novo e da sua génese militar, para querer criar um poder quase paralelo como foram a certa altura
               os Camisi Nere e as SS respetivamente na Itália e na Alemanha. Para todos os efeitos, a milícia foi
               mais uma força paramilitar de combate aos inimigos internos, subordinada ao Exército em tempo
               de guerra ou em caso de distúrbios mais violentos no país (pp. 57-62 fundamentalmente).
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