Page 15 - recrutamento
P. 15
Introdução – Recrutamento e Mobilização: uma perspetiva histórica
logísticas, para citar alguns, obrigam a que um soldado deva ter uma preparação,
rusticidade e resistência emocional próprias para essa forma de guerra. Cada
período histórico aqui tratado pelos autores reflete uma realidade própria de
interação de fatores e circunstâncias como influência direta no recrutamento
e na mobilização: estrutura social; perceção de ameaças; natureza do regime;
situação económica; ambiente internacional; tecnologia; organização do estado;
ideologia política. Compreender o processo de recrutamento e mobilização em
cada período histórico, desde a fundação à atualidade, com as suas dinâmicas
próprias é contribuir também para se compreender como o Exército se deve
adaptar em antecipação às mudanças dos novos tempos.
A identidade nacional portuguesa procura e encontra o seu momento
fundacional no governo de D. Afonso Henriques, iniciado em 1128, como
resultado da secessão de uma parcela do reino de Leão. A perspetiva identitária
gera frequentemente a ilusão de que para trás não existia nada ou o que existia
não tinha a forma perfeita que só os feitores de um novo reino lhe conseguiram
dar. Se, por um lado, foi guerra que tornou viável a formação e consolidação de
um país independente no ocidente peninsular, também é verdade que toda a
sociedade cristã do século XII se encontrava organizada em função da guerra e
que os modelos de mobilização militar desses tempos eram, em larga medida,
análogos aos dos reinos limítrofes.
A par da aristocracia guerreira, havia outras entidades que conduziam a
guerra em convergência e apoio da Coroa, destacando-se as ordens militares
e os poderes concelhios. Apesar de partilharem modelos de recrutamento
e mobilização, cada uma destas entidades dispunha de um universo próprio
de recursos humanos e era responsável pela geração e manutenção do seu
efetivo, num tempo em que a conflitualidade contra o infiel, contra os reinos
cristãos vizinhos e mesmo a guerra endémica eram uma constante. Este modelo
bastante descentralizado, de corpos militares de constituição temporária, fazia
do exército régio uma estrutura com um pequeno núcleo semipermanente (a
guarda régia) ao qual se juntavam contingentes de diferentes proveniências, em
função dos objetivos, duração e da área espacial da campanha.
Em meados do século XIII, o final da Reconquista portuguesa e a
consolidação das estruturas administrativas do reino viram refletida, na dimensão
militar, a estabilização de modelos de mobilização centralizados a partir da corte.
Surgem corpos militares de efetivo previamente fixado e registado (destacando-
-se os cavaleiros aquantiados e os besteiros do conto), estabelecendo-se o
3