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RecRutamento no exéRcito PoRtuguês – do condado Portucalense ao século xxi

            quantitativo de combatentes com que cada município estava obrigado a servir no
            exército régio. Em simultâneo, as ordens militares de Cristo, de Avis, de Santiago
            e do Hospital, como únicos corpos guerreiros permanentemente constituídos e
            de disponibilidade imediata, foram sendo progressivamente mais dirigidas pela
            Coroa. No início do século XV, aquelas ordens acabaram por ter como mestres e
            administradores algumas figuras proeminentes da casa real e, no reinado de D.
            João I, viram também estabelecido, de modo centralizado, o número de lanças
            de cavalaria que estavam obrigadas a apresentar para o serviço régio.
                  Foi  também  no  início  do  século  XV  que  os  portugueses,  libertos  da
            ameaça  castelhana  e  das  convulsões  da  Europa  Ocidental  transpirenaica
            associadas à Guerra dos Cem Anos (1337-1453), abraçaram o oceano. A guerra
            era agora expedicionária, levada até às costas africanas por esquadras mais
            numerosas e poderosas. Quando, já em 1471, D. Afonso V partiu à conquista
            de Arzila, o reino foi capaz de mobilizar, na descrição de Rui de Pina, quase
            cinco centenas de navios e perto de 30 000 combatentes, entre marinheiros,
            besteiros, espingardeiros e artilheiros.
                  A  posse  de  praças  africanas  alterou  o  modo  português  de  fazer  a
            guerra, associado às necessidades do novo cenário. Em certa medida foi como
            regressar  às  táticas  do  tempo  da  Reconquista,  das  quais  havia,  ao  tempo,
            ecos remotos (note-se que os homens do século XV distavam da Reconquista
            mais ou menos o mesmo tempo que hoje distamos de Napoleão Bonaparte).

            Regressavam muito trabalho de guarnição, muitas patrulhas a cavalo nas zonas-
            -tampão  estabelecidas  em  torno  das  praças  conquistadas,  guerra  de  saque,
            troca de prisioneiros, mas, sobretudo, tinham sido inaugurados novos tipos de
            recrutamento e mobilização, destinados a sustentar uma guerra ultramarina.
                  No  cenário  europeu,  a  guerra  moderna,  com  o  triunfo  das  armas  de
            fogo, aumentou o efetivo presente nas campanhas para a ordem das dezenas
            de milhar. Se, por um lado, uma parte da mobilização cabia aos senhores das
            terras  que  continuavam  a  apresentar-se  com  as  suas  mesnadas  senhoriais
            no  exército  régio,  por  outro,  as  tropas  concelhias  continuavam  a  ter  o  seu
            papel, organizadas em forças de infantaria e de cavalaria, correspondendo às
            ordenanças a que se refere a lei de D. Sebastião, de 1570. No início do século
            XVI, o serviço militar foi-se profissionalizando e caminhando no sentido de um
            exército régio estável, mas nos momentos de emergência militar continuou-se
            a recorrer ao recrutamento à força.


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