Page 22 - recrutamento
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RecRutamento no exéRcito PoRtuguês – do condado Portucalense ao século xxi
nos territórios ultramarinos. Esta ameaça correspondia a uma forma de guerra
que exigiu um enorme esforço de mudança conceitual e de recursos ao longo de
mais de uma década. Nem mesmo a entrada de Marcelo Caetano, que prometia
alterações significativas no regime, trouxe alguma mudança na obstinação com
a manutenção da guerra.
O esforço de guerra obrigou a uma mudança no recrutamento e mobilização
de massas para África. Pela primeira vez, desde a República, a conscrição
universal e obrigatória passou a ser a norma e tornou-se cada vez mais eficaz. No
início da guerra, em 1961, havia cerca de 40 000 soldados nas Forças Armadas,
efetivo que ascendeu a cerca de 215 000 em 1974. Os efetivos mobilizados nos
três teatros totalizavam cerca de 117 000, dos quais 107 000 eram do Exército
e, destes, 65% cumpriam o serviço militar obrigatório. A natureza do conflito,
que exigia a presença de forças disseminadas no terreno e forças de intervenção
com treino especial, fez com que o Exército ocupasse o lugar central nas Forças
Armadas. As questões políticas e sociais conduziram também a que os faltosos
e desertores passassem de 10% em 1961, para cerca de 20% em 1974. Com a
exaustão sentida pelas autoridades, a africanização das tropas passou a ser um
objetivo importante para manter um nível de efetivos que garantisse o esforço
de guerra. Do total de efetivos, as tropas africanas passaram de cerca de 20% em
1961 para cerca de 40% em 1974.
Outras mudanças importantes ocorreram no seio dos quadros permanentes
para garantir o enquadramento necessário à “guerra de guerrilha”, em especial
no posto de capitão, que acabaria por gerar uma onda de descontentamento
que marcou a revolta militar de abril de 1974, que derrubaria o regime. Também
o facto de cerca de um milhão de portugueses ter cumprido o seu serviço militar
obrigatório nas colónias é um fator a considerar na revolta, na mudança do
regime e na convulsão que se lhe seguiu.
A consolidação democrática, na década de 1980, introduziu importantes
alterações na política de defesa nacional, com especial incidência no
recrutamento. A república havia introduzido o serviço militar obrigatório em
1911 e a consolidação da democracia introduziu o modelo de serviço profissional
que hoje temos. Esta mudança teve razões técnicas, derivadas da necessidade de
lidar com equipamento de tecnologia de ponta; e razões políticas relacionadas
com o novo tipo de missões e com a total subordinação das forças armadas ao
poder político.
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