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RecRutamento no exéRcito PoRtuguês – do condado Portucalense ao século xxi
como soldada, maravedis ou contia. Por conseguinte, quer o monarca, quer os
restantes poderes, necessitavam sempre de riqueza para conduzir a guerra .
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Os serviços militares a desempenhar eram diversos, bem claros e
com expressão prática. Entre os defensivos e de necessidade continuada,
especialmente nas regiões mais expostas a ameaças, contam-se os de vigilância.
Eram normalmente organizados em torno de um castelo que, não tendo
observação direta sobre todo o território à sua responsabilidade, se fazia rodear
de postos de vigia, dos quais ainda hoje temos vestígios em topónimos, como
Atalaia, Guarda, Custóias, Almenara, Vigia, Esculca, Inculca, Facho, Faro, Vela,
Belage, Pendão, Sentinela, entre outros . Como a vigilância subtraía homens aos
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trabalhos agrícolas, situação que era particularmente penosa nos municípios
de fronteira de fundação recente, o rei contribuía para parte esse esforço,
repartindo o serviço entre homens pagos por si e homens dos concelhos. Em
Leiria, em plena fronteira com o Islão em 1142, o rei comprometeu-se a assumir
a totalidade da vigilância no primeiro ano, passando depois a vigorar um modelo
semelhante ao preconizado no foral de Coimbra de 1111, com cada parte (rei e
município) a assegurar o serviço durante metade do ano .
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Uma boa parte do serviço militar era desempenhado de forma
descentralizada e competia a cada unidade familiar, designada por “casal”, saber
exatamente qual o seu papel, que normalmente era transmitido de geração em
geração. Era certamente o caso dos dez casais de São Mamede de Lindoso (c.
Ponte da Barca), que sempre que lhes era ordenado, tinham por obrigação ir
vigiar as portelas de Lindoso e de Cabril, possíveis eixos de penetração de hostes
galegas . A colagem de certos serviços a uma mesma família pode ter estado
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na origem da denominação de alguns postos de vigia, conhecidos pelo nome do
indivíduo a quem competia a função. São os casos da “atalayam de Gunsalvo
7 HESPANHA, António – História das Instituições: Épocas medieval e moderna. Coimbra: Livraria
Almedina, 1982, pp. 84-85.
8 BARROCA, Mário – Organização territorial e recrutamento militar. In Nova História Militar
de Portugal. Coord. Manuel Themudo Barata e Nuno severiano Teixeira, Vol. 1. Rio de Mouro:
Círculo de Leitores, pp. 69-94, 2003, p. 86. A prática era de tal ordem que alguns destes termos já
eram topónimos estabilizados no século XIII, como se depreende por uma herdade denominada
“Esculca de Susaa”, mencionada em Fareja (c. Castro Daire), nas Inquirições de 1258 [Portugaliæ
Monumenta Histórica: Inquisitiones. Vol. I. Lisboa: Academia das Ciências, 1888-1961, p. 938
(PMH-I-I, p. 938)] ou de um cabeço nas imediações de Vila Viçosa, em 1270: “vadit ad cimam
de capite de Atalaya” [Portugaliæ Monumenta Histórica: Leges et Consuetudines. Vol. I. Lisboa:
Academia das Ciências, 1856-1868, p.717 (PMH-LC-I, p. 717)].
9 PMH-LC-I, p. 356 de 1111, junho, 25 e PMH-LC-I, p.376 de 1142, abril.
10 PMH-I-I, p. 414a de 1258.
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