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RecRutamento no exéRcito PoRtuguês – do condado Portucalense ao século xxi

            finais de 1383 – a uma política sistemática de doação, ou melhor, de promessa de
            doação de terras, préstamos, lugares, bens, rendas e direitos destinada a atrair
            e a manter junto de si todos quantos se predispusessem a servi-lo em armas,
            recorrendo para isso aos bens que iam sendo confiscados aos partidários do rei
            de Castela. O Mestre de Avis seguia à risca o conselho de Álvaro Pais, que lhe terá
            dito: “Daae aquello que vosso nom he, e prometee o que nom teendes” . Mas as
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            dúvidas acerca do destino da revolta lisboeta não eram de molde a credibilizar
            quaisquer  formas  de  remuneração  assentes  numa  promessa.  Com  efeito,  a
            doação de facto, a concretizar-se, só ocorreria, na melhor das hipóteses, a médio
            prazo e estava condicionada a uma vitória sobre as forças do rei castelhano, o
            que, compreensivelmente, não as tornava particularmente atractivas. Este tipo
            de remuneração também não apresentava grandes vantagens para D. João, pois
            estava longe de vincular – ao contrário do que acontecia com as contias – quem
            as recebia à prestação de qualquer tipo de serviço militar . Era, pois, necessário
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            recompensar os combatentes de maneira mais visível e imediata, ou seja, através
            do pagamento de um soldo proporcional ao número de dias de serviço, mas que,
            como sublinha João Gouveia Monteiro, era pago “quando e como se podia” .
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            E tal como o Mestre de Avis, também Juan I recorreu, para além da atribuição
            de contias, a formas de remuneração semelhantes, sobretudo ao pagamento de
            soldos, de maneira a assegurar a lealdade dos sectores da nobreza portuguesa
            que o apoiavam .
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                  O  pagamento  de  soldos  como  principal  forma  de  remuneração  dos
            nobres – vassalos ou não – que combatiam sob as ordens de D. João I ter-se-á
            mantido durante o ano de 1386 e primeiros meses de 1387. Foi preciso esperar
            pelo segundo semestre deste ano para o rei, porque dispunha já de condições
            políticas e militares para o fazer – a guerra com Castela estava claramente
            a pender a seu favor –, se dispor a recuperar o modelo de remuneração da
            nobreza assente na atribuição de contias. Ficou, então, definido o pagamento
            de  1000  libras  para  cada  vassalo  –  veja-se  como  a  inflação  levou  a  um
            espectacular aumento do valor destes estipêndios! – a que acresciam 700 libras
            por cada lança que, em função do valor total da contia, cada um dos vassalos


            45  Crónica de D. João I, Vol. 1, Cap. XXVII, p. 56.
            46  MARTINS, Miguel Gomes – A Vitória do Quarto Cavaleiro. O Cerco de Lisboa de 1384: Lisboa:
            Prefácio, 2006, pp. 20-21.
            47  MONTEIRO, 1998, p. 37.
            48  Crónica de D. João I, Vol. 1, Cap. LXVII, pp. 130-131.
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