Page 74 - recrutamento
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RecRutamento no exéRcito PoRtuguês – do condado Portucalense ao século xxi
finais de 1383 – a uma política sistemática de doação, ou melhor, de promessa de
doação de terras, préstamos, lugares, bens, rendas e direitos destinada a atrair
e a manter junto de si todos quantos se predispusessem a servi-lo em armas,
recorrendo para isso aos bens que iam sendo confiscados aos partidários do rei
de Castela. O Mestre de Avis seguia à risca o conselho de Álvaro Pais, que lhe terá
dito: “Daae aquello que vosso nom he, e prometee o que nom teendes” . Mas as
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dúvidas acerca do destino da revolta lisboeta não eram de molde a credibilizar
quaisquer formas de remuneração assentes numa promessa. Com efeito, a
doação de facto, a concretizar-se, só ocorreria, na melhor das hipóteses, a médio
prazo e estava condicionada a uma vitória sobre as forças do rei castelhano, o
que, compreensivelmente, não as tornava particularmente atractivas. Este tipo
de remuneração também não apresentava grandes vantagens para D. João, pois
estava longe de vincular – ao contrário do que acontecia com as contias – quem
as recebia à prestação de qualquer tipo de serviço militar . Era, pois, necessário
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recompensar os combatentes de maneira mais visível e imediata, ou seja, através
do pagamento de um soldo proporcional ao número de dias de serviço, mas que,
como sublinha João Gouveia Monteiro, era pago “quando e como se podia” .
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E tal como o Mestre de Avis, também Juan I recorreu, para além da atribuição
de contias, a formas de remuneração semelhantes, sobretudo ao pagamento de
soldos, de maneira a assegurar a lealdade dos sectores da nobreza portuguesa
que o apoiavam .
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O pagamento de soldos como principal forma de remuneração dos
nobres – vassalos ou não – que combatiam sob as ordens de D. João I ter-se-á
mantido durante o ano de 1386 e primeiros meses de 1387. Foi preciso esperar
pelo segundo semestre deste ano para o rei, porque dispunha já de condições
políticas e militares para o fazer – a guerra com Castela estava claramente
a pender a seu favor –, se dispor a recuperar o modelo de remuneração da
nobreza assente na atribuição de contias. Ficou, então, definido o pagamento
de 1000 libras para cada vassalo – veja-se como a inflação levou a um
espectacular aumento do valor destes estipêndios! – a que acresciam 700 libras
por cada lança que, em função do valor total da contia, cada um dos vassalos
45 Crónica de D. João I, Vol. 1, Cap. XXVII, p. 56.
46 MARTINS, Miguel Gomes – A Vitória do Quarto Cavaleiro. O Cerco de Lisboa de 1384: Lisboa:
Prefácio, 2006, pp. 20-21.
47 MONTEIRO, 1998, p. 37.
48 Crónica de D. João I, Vol. 1, Cap. LXVII, pp. 130-131.
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