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2. O Recrutamento Militar Entre o Final
da Reconquista e as Vésperas de Ceuta (1249-1415)
guarda do Rei
À imagem do que sucedia um pouco por todos os reinos do Ocidente
Medieval, também em Portugal se assistiu, em meados do século XIII, a um
aumento substancial do número de efectivos que compunham a Guarda do
Rei, um crescimento que decorre em paralelo com uma alteração funcional
deste corpo, que foi perdendo a sua feição eminentemente palaciana para se
converter num autêntico “pequeno exército”, que as fontes começam a designar
como “mesnada do rei”.
Documentada como tal a partir do reinado de Afonso III, o seu núcleo
central era constituído, sobretudo, por contingentes de cavalaria integrados
por membros de linhagens como as de Aboim, Barreto, Briteiros, Casével,
Chacim, Coelho, Cogominho, Correia, Cunha, Curutelo, Espinho, Paiva, Pimentel,
Portocarreiro e Vivas, entre outros, alguns dos quais, pela relevância dos serviços
prestados ao monarca, conseguiram mesmo alcançar a rico-homia. Segundo
Leontina Ventura, estes cavaleiros, quase todos da mesma idade do rei – alguns
dos quais teriam mesmo sido confiados aos seus cuidados desde bastante
cedo –, constituíam, através do serviço armado, uma “aristocracia que se foi
consolidando e que se mantinha abaixo da elite das famílias da alta nobreza” .
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De modo a assegurar-se da sua prontidão e, simultaneamente, da sua
eficácia, Afonso III fazia-lhes – pelo menos a alguns deles – entrega de cavalo e,
provavelmente, de algum do seu armamento, designadamente a loriga de corpo
ou o lorigão, as brafoneiras, o escudo, a lança e a loriga de cavalo, para além de
os remunerar através do pagamento de soldadas . Tudo isto parece confirmar
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a ideia de que esta mesnada era mobilizada, não só para a protecção diária do
monarca, mas também para acções armadas de maior envergadura, nas quais
actuava como uma autêntica “força de acção rápida” e como o núcleo central
das hostes régias, missões tornadas possíveis pelo facto de a maior parte dos
seus membros se encontrar quase sempre na corte .
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Mas qual terá sido o motivo, ou motivos, que levaram à transformação da
Guarda do Rei na Mesnada do Rei? Face ao silêncio das fontes, a resposta não é
fácil de encontrar. Contudo, à luz daquilo que sabemos a respeito da relutância
VENTURA, 1992, Vol. 1, pp. 153-154.
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113 MARTINS, 2014, pp. 41-42 e p. 211.
GARCÍA FITZ, Francisco – Ejércitos y Actividades Guerreras en la Edad Media Europea. Madrid:
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Arco/Libros, 1998, p. 35.
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